Eu estava pensando em escrever sobre a grade curricular da Engenharia de Alimentos (FZEA-USP), abordando as disciplinas que nos são ministradas e a influência das mesmas na nossa formação. É lógico que eu reconheço a importância da maioria dessas disciplinas, mas algumas deixam uma pergunta inevitável no ar: pra quê estudar isso se eu acho que nunca vou usar?
Foi aí que lendo a introdução do livro Rich Dad, Poor Dad vi que essa é uma pergunta geral e que também é feita por jovens norte-americanos. A resposta dada por Robert Kiyosaki chega a ser dura quando diz: as crianças passam anos em um sistema educacional antiquado, estudando algumas coisas que nunca vão usar.
É lógico que não sou mais criança, mas outras partes dessa introdução mostram que esse é um problema enfrentado na universidade também. Quem sou eu pra falar do sistema educacional brasileiro, mas posso dizer que em várias situações eu pensei: isso é decoreba, a educação tem que mudar.
Momento de reflexão à parte, vou falar resumidamente sobre as disciplinas e o que eu consegui enxergar de útil nelas, seja pra utilização prática ou apenas desenvolvimento do raciocínio lógico necessário aos engenheiros, que serão em grande parte, solucionadores de problemas.
A Fzea disponibiliza a grade curricular em seu site, com o período ideal e carga horária das disciplinas. Quem quiser acessar a grade da última turma que entrou (2009) é só clicar AQUI!
É lógico que eu não vou falar de cada uma das disciplinas individualmente, mas posso responder dúvidas específicas se alguém tiver. Vou destacar as maiores dificuldades e aquelas disciplinas que o nome em si fala muito pouco pra quem nunca viu o assunto.
O primeiro semestre foi o mais esquisito pra mim. Ali eu me dei conta que Engenharia de Alimentos é realmente uma área Exata e Cálculo I tem o maior pedaço da carga horária. A disciplina em si não é difícil, mas a falta de aplicação vista por quem acabou de chegar na faculdade é cruel. Entretanto, acredite, é talvez a única disciplina que nos acompanha os cinco anos e tem sua utilidade.
No primeiro semestre sempre questionamos se era esse o curso certo, mas Introdução à Engenharia de Alimentos responde um pouco da dúvida. Ainda que não seja a disciplina mais legal do curso, é a primeira a falar sobre a atividade do engenheiro de alimentos em si e ali você já pode imaginar se vai querer seguir aquilo ou não.
Os cálculos, físicas, químicas, bioquímicas e microbiologias de uma maneira geral continuam nos acompanhando, mas é no quarto semestre que começa, ainda que suavemente, uma mudança. Nesse semestre temos “Química dos Alimentos” e “Higiene Industrial e Legislação” que começam a nos apresentar a indústria de alimentos. Daí pra frente as coisas tendem a melhorar, rsrsrsrs.
Chegam os Fenômenos de Transportes. E eu também me perguntava se estava relacionado com caminhão, estrada, logística, hahahaha. Não tem nada a ver. Na verdade os FTs (como chamamos) estudam o transporte de quantidade de movimento (FT1, semelhante à Mecânica dos Fluidos em outras faculdades), energia (FT2) e massa (FT3).
Os fenômenos de transporte são mais conceituais e esses conceitos são aplicados nas Operações Unitárias, que em geral, trazem o dimensionamento de equipamentos da indústria de alimentos. Pode até parecer estranho, mas pense, como projetar um pasteurizador sem entender a transferência de calor? Não tem como. Assim, somados, esses conceitos nos ajudam a entender e dimensionar as bombas de sucção e recalque, tubulações, agitadores, filtros, evaporadores, pasteurizadores, destiladores, secadores e por aí vai.
Sem dúvida, dentre as disciplinas exatas, as Operações Unitárias foram as mais legais pra mim.
Ah, no meio do caminho também temos Termodinâmica, que é uma disciplina muito interessante (eu gosto, tudo bem, é uma opinião tendenciosa), mas que é muito abstrata à princípio e por isso é difícil.
Eu acabei não seguindo uma ordem linear com as disciplinas, mas foi assim que meu pensamento foi organizado e continuo no vai e vem, até porque todos os semestres fazem isso na nossa memória.
Temos as disciplinas de laboratório também, como Química Analítica, Físico-química dos Alimentos, Análise de Alimentos (I e II), Análise Sensorial, que como dizem os nomes envolvem análises mesmo. Seja de pH, acidez titulável, composição (proteínas, umidade, carboidratos, lipídeos...), concentração de alguma coisa (como corante em refresco em pó ou sódio em sopa pronta) até a Análise Sensorial que tenta entender a percepção do consumidor em relação à determinada característica, claro que pra isso tem análise estatística envolvida, mas é bem tranquila.
Já chegando no fim do curso temos as Tecnologias. Eita fase boa. As tecnologias também envolvem análises específicas pra determinar a qualidade da matéria-prima. Afinal, não tem como processar uma matéria-prima ruim e chegar num produto final excelente (ouvimos isso SEMPRE).
Analisamos possíveis fraudes no leite, por exemplo. Fazemos iogurtes, queijos, sorvete, creme de leite, vemos abate de animais (quem não gosta, não precisa assistir) e desossa, fazemos nuggets, linguiças, hambúrgueres, limpamos peixes e avaliamos sua qualidade por meio de padrões já determinados (isso fede), salgamos, desitratamos, defumamos e fazemos muitas coisas legais.
Ah, uma coisa que não falei, é que também temos disciplinas como Gestão Industrial e Distribuição de Alimentos que contribuem muito pra entendermos Marketing, Logística e termos uma visão sistêmica da cadeia de alimentos e que tudo isso é contemplado com as disciplinas Planejamento e Projetos I e II, em que desenvolvemos uma empresa e um produto inovador, analisando o mercado, o consumo, a viabilidade econômica, dimensionando câmaras frigoríficas, gastos energéticos, cotando equipamentos, avaliando rendimentos, escolhendo a cidade, determinando o número de empregados, os salários e muito mais. Resumindo, isso dá um trabalhão e é coroado com a apresentação final pra uma banca de professores, que em geral, reconhecem a nossa “evolução acadêmica”.
Como eu não fazia idéia das disciplinas quando entrei na faculdade, acho que uma visão simples e prática pode ajudar os "duvidandos" a definirem se gostam ou não desse área.
Posso dizer, por experiência pessoal, que o começo é chato e que o desistir às vezes bate na caixola, mas que a melhor coisa que fiz foi não abandonar o curso. Os momentos que passei, os choros com notas baixas e alegrias com os raros 10, as amizades únicas e especiais, o morar em república e a saudade de casa, todo o aprendizado acadêmico e pessoal me fazem ter a certeza que fiz a escolha certa e mais desafiante pra quem sempre pensou em fazer HUMANAS, e por isso, mais gostosa.